IMBECILIDADE

               IMBECILIDADE

– Geração esquisita, gente maluca e acéfala! Que me perdoem os pensamentos um tanto ásperos, mas, não o pude evitá-los; eles vinham como rajadas de ventos em meu modesto e incrédulo cérebro naquela tarde amena de verão enquanto eu corria alguns quilômetros ao redor do bairro Santa Lúcia avizinhado do Vitória onde eu morava.

Enquanto o suor molhava minha fronte queimada pelo sol ainda um tanto quente do entardecer eu me distraia olhando o movimento das moçoilas e os costumes que o modernismo com sua revolução às avessas provocou nos costumes e até mesmo nas virtudes das nossas famílias e, principalmente, nas nossas mulheres.

Um festival de cachorros e gatos surgiam presos por coleiras ziguezagueando pelas calçadas acinzentadas e esburacadas do bairro controlados nada mais nada menos por jovens casais que faziam o seu passeio vespertino depois de mais um dia de trabalho nas tantas fábricas que se espalhavam em enormes barracões por toda a região.

Casais sem filhos, totalmente por opção. Eles chamam seus cães e gatos de filhinhos, passeiam com eles à tarde substituindo as crianças que não nasceram contradizendo a lei natural e transcendental – Crescei e multiplicai-vos – Mas, por algum desvio insano de pais egoístas e despreparados, foram substituídas pelos bichinhos de estimação, e quando digo substituídos o afirmo com toda autoridade que o verbo impregna a forma plural do particípio do passado – Substituídos, trocados por alguém, neste caso específico, por um animalzinho de estimação.

Se fosse o contrário, se pudessem questionar que estou errado em meus argumentos, que sou apenas um antiquado senhor de quase sessenta anos que acredita que ainda tem forças para correr feito um atleta pelo bairro, que deveria estar em casa descascando batatas para o jantar e não metendo o nariz na cumbuca alheia, eu retrucaria sem pestanejar:

– Geração de Malucos.

Basta olhar para Dona Maricotinha Tavares. A pobre senhora me confessou ainda a poucos dias atrás que seu sonho era ser avó, mas, disse num tom amargurado – Meu filho não quer ser pai, ele é inteligente, muito centrado na carreira acadêmica, acha que por filhos nesse mundo tão hostil é maluquice.

Me lembro que por pouco não cometi a maior das gafes, tal qual aquela ilustre jornalista da CNN que disse que Chile e Equador não fazem parte da América do Sul; eu quase caio no mesmo desvario, o que não seria histórico, mas, sem dúvida, um desvario familiar por conta da situação que o filho da pobre quase me submeteu.

Estava eu a correr pelas ruelas quando me deparei com o rapazola descendo do carro em frente à casa da mãe e metendo a mão um tanto apressado num carrinho de bebê no banco traseiro.

– Me aproximei curiosíssimo e quando ia cumprimentá-lo pelo garboso bebezinho que imaginei estar ali enrolado no cobertorzinho de veludo, com suas bochechinhas vermelhas e a boquinha agarrada a uma chupeta Philips Avent Ultra Hair; estanquei pasmo ao verificar que ali no lugar de um inocentinho bebê estava um cachorrinho poodle estirado preguiçosamente no carrinho.

– Vamos ver a Vovó – disse ao animalzinho enquanto me direcionava um leve sorriso antes de sumir pelo corredor conversando com o animal como se fosse seu filho consanguíneo.

–  Pobre geração bestializada! pobres mães sem netos! E não me venha com aquele discurso digno de defensores de animais maltratados, nada contra os bichinhos que estão aqui por um desígnio Divino e até nos alegram com suas peripécias animalescas, mas, tratá-los como seres humanos é um passo para a esquizofrenia.

Poderia eu argumentar sobre as descobertas científicas dos últimos anos, que a esquizofrenia é causada pelo contado mais íntimo com os gatos, que esses bichinhos fofinhos não podem dormir na mesma cama que seu dono, mas, deixe pra lá a academia, ficarei apenas no campo da sensatez, esta que é párea para a maioria dos mortais.

Apelemos, pois, a razão, filosofemos um pouco no campo racional; homens tem duas pernas, animais são quadrúpedes, homens pensam e tem alma, animais agem por instinto não pensam, não tem alma e não vão para o céu.

O que vejo pelas ruelas um tanto empoeiradas do bairro, são mulheres jovens, maduras, sozinhas ou acompanhadas, passeando com seus bichinhos. Nenhuma criança por perto, nenhuma menininha de olhos azuis, nenhuma mulatinha de cabelos lindos encaracolados correndo na frente.

Mas, diante dos nossos olhos se ergue um castelo de ilusão que é vendido a preço de ouro para esses pobres filhos da revolução marxista.

Porém, para que não fique o falado pelo não falado e até mesmo não venham questionar que minhas argumentações são um tanto descabidas e desconexas, segue a lista das loucuras delirantes que se antepõe os nossos olhos um tanto extasiados pelas loucuras de uma geração que perdeu totalmente a capacidade de pensar: Existem creches para animais, cuidadores de animais, hotel para seus bichinhos curtirem o final de semana, manicure e pedicure de animais, e entre outras mazelas, duas me chamam mais a atenção: Festa de aniversários para seus bichinhos, onde todos os animais das redondezas são convidados com direito a vela e presentes e a segunda insensatez velório para a despedida dos pobres que partiram dessa para o nada.

Não bastasse tudo isso, vem aquela velha rica e solitária com uma conta bancária cheia de dígitos e deixa em seu testamento toda sua fortuna para seus dois cães, o Oscar e o Leo.

Bem, vamos a corrida …

E.L.NUNES